quinta-feira, 3 de novembro de 2011

... sobre a Arte da Cerâmica por Hebert Read
“A cerâmica é ao mesmo tempo a mais simples e a mais difícil de todas as artes. A mais simples, por ser a mais elementar; a mais difícil, por ser a mais abstrata. Historicamente, encontra-se entre as artes mais primitivas. Os vasos mais antigos que se conhecem eram modelados à mão em barro cru, tal qual era extraído da terra, e secos ao sol e ao vento. Mesmo nesse grau do seu desenvolvimento, antes de possuir escrita, literatura ou mesmo uma religião, o homem possuía já esta arte, e os vasos que então produzia ainda são capazes de nos sensibilizar por suas formas expressivas. Quando o homem descobriu o fogo e aprendeu a tornar seus vasos rijos e duradouros, quando inventou a roda e como oleiro pôde acrescentar ritmo e movimento ascensional ao seu conceito de forma, estavam presentes todos os elementos essenciais da mais abstrata de todas as formas de arte. Esta foi evoluindo desde as suas humildes origens até que se tornou a arte representativa da raça mais intelectual e sensitiva que o mundo conheceu. Um vaso grego é o verdadeiro protótipo da harmonia clássica. Depois, para o Oriente, outra grande civilização fez da cerâmica a sua arte mais típica e mais estimada, e levou-a a requintes mais delicados que os próprios Gregos. Um vaso grego é harmonia, mas um vaso chinês, uma vez liberto das influências impostas por outras culturas e outras técnicas, alcança harmonia dinâmica: já não é só uma relação numérica, mas um movimento vivo. Não é um cristal, é uma flor. Os tipos perfeitos de cerâmica, representados nas artes da Grécia e da China, têm os seus equivalentes aproximados noutras regiões: no Peru e no México, na Inglaterra e na Espanha medievais, na Itália do Renascimento, na Alemanha do século XVIII – de fato, esta forma de arte é tão fundamental, está tão intimamente ligada às necessidades mais elementares da civilização, que o gênio nacional de um povo tem sempre de achar maneira de nela se exprimir. Julga-se a arte de um país, julgue-se a sutileza da sua sensibilidade pela sua cerâmica: é uma segura pedra de toque. Cerâmica é arte pura; arte liberta de qualquer intenção imitativa. A escultura, com a qual está mais intimamente relacionada, teve desde o início uma intenção imitativa, e nessa medida talvez tenha sido menos livre que a cerâmica como meio de expressar o desejo de forma; a cerâmica é a arte plástica na sua essência mais abstrata.
“Não devemos temer a palavra “abstrato”. Toda arte é primariamente abstrata. Pois o que será a experiência estética, quando limpa dos seus ornamentos e associações acidentais, senão uma resposta do corpo e do espírito humanos a harmonias inventadas e isoladas? A arte é uma fuga do caos. É movimento ordenado em números; é massa encerrada em medida; é a indeterminação da matéria em busca do ritmo da vida.”

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